quinta-feira, 31 de março de 2011

Explosão necessária

Tenho de explodir. Porque hoje senti que, por vezes, vivo demasiado no meu mundinho perfeito e me esqueço de que lá fora está a realidade. A realidade que não quero aceitar. Uma realidade onde meninas, sim porque é isso mesmo que elas são, sofrem de mutilação genital todos os dias. A realidade que tem pessoas com mais de quarenta anos que não sabem escrever ou que possui jovens de 14/15 anos que não podem ter uma vida minimamente normal porque nem o seu nome sabem escrever. A realidade onde opções alheias determinam a vida de outrém. Uma triste realidade onde a liberdade de expressão e um simples ''não'' são ignorados. A fria e crua realidade de pessoas que não conseguem sequer ler os rotúlos das embalagens de um supermercado porque simplesmente não sabem ler. É esta realidade, tão deles mas tão nossa, que me faz ver a necessidade de se dizer, investigar e mostrar certas coisas. É o contacto com este tipo de realidades que me faz sentir pequenina, que me aperta o estômago, que me corroí por dentro. Mas, são este tipo de sentimentos que, depois, me fazem querer mudar. Mudar-me a mim e tentar mudar os outros. Há coisas que não podem ser alteradas mas outras podem. São nessas coisas que podemos mudar em que devemos apostar. Porque hoje podemos ser confrontados com realidades que nos magoam, mas  amanhã é um novo dia e essas realidades podem, e devem, ser alteradas. Explodi, tinha de explodir.

N.Vieira

terça-feira, 29 de março de 2011

O mistério do par

Fecho os olhos. A imagem de uma mão foi inevitável. Inesperadamente surge a outra mão. Um olho aparece. Sem querer um outro olho invade a minha mente. Um ouvido.. mais tarde outro ouvido. Abro os olhos, e estupidamente chego sem querer à conclusão de que tudo tem um par. Seja um par de mãos, olhos, ouvidos ou pernas. Mas, fugindo à fisionomia do corpo humano, tudo o resto no mundo também tem um par. Uma cadeira há-de combinar sempre com uma mesa, um copo não serve para nada se não tiver qualquer tipo de bebida lá dentro e o mar não teria a mesma beleza se não tivesse a areia à sua volta. E nós seres humanos, será que também temos um par? Sinceramente.. eu acho que sim. Que sentido teria a vida se cada um de nós não tivesse outro alguém que combinasse exactamente connosco? Todos temos um par, ou dois pares, ou três.. na minha opinião, somos um ser que pode combinar com mais do que um par. Uma filha combina com a mãe, um irmão combina com outro irmão, um amigo precisa de combinar com outro, eu tenho a necessidade de combinar contigo. Para tudo aquilo que o mundo criou, criou um par correspondente. E, é esse mesmo par que dá significado àquilo que nós e eles representam. Claro que uma pessoa, um objecto ou um sentimento tem valor por si só, mas será que o seu valor não dobra quando encontra um par que o complementa? Um par capaz de fazer o sentido alargar, capaz de dar cor a tudo o que o rodeia, um par que no seu conjunto se torna, dentro do possivel, perfeito. E, é isto.. hoje, acredito que um par torna tudo melhor. Amanhã? Amanhã logo se vê.

N.Vieira

sexta-feira, 25 de março de 2011

O mundo do ''se''

E se? Eis a questão que permanentemente invade o dia-a-dia de um ser humano desconcertante e insatisfeito como eu. Questões e possibilidades que nos levam a perder meses, dias, horas, minutos e segundos da nossa vida. Uma busca constante de uma resposta a uma questão que, a meu ver, parece impossivel de obter. A inevitabilidade de pensarmos ''E se não tivesse comido o que comi?'', ''E se José Sócrates não tivesse sido eleito Primeiro-ministo??'', ''E se eu não lhe  tivesse dito o que sentia?'', ''E se eu não fosse tal e qual como sou?''.. Não passam de ''se'' e mais ''se'' que, em vez de me transmitirem algum controlo, só me fazem mergulhar num mundo do imaginário que, provavelmente, nunca vou conseguir atingir. 
Apesar de tudo, é raro o dia da nossa vida em que não nos questionamos com aquilo que poderiamos ter dito ou feito. Nós, os seres humanos, nunca estamos realmente satisfeitos. Temos sempre a necessidade de pensar naquilo que poderia ter acontecido, ou não, se algo não tivesse acontecido. É esta insatisfação que muitas vezes leva a uma vida de incertezas e inquietações que não nos deixam viver plenamente.
Sim, eu sei que é impossivel não sermos invadidos pelo mundo do ''se'' e mais ''se'', mas há uma necessidade de conseguir seguir com a nossa vida independentemente das probabilidades existentes. Aquilo que acontece é porque tem de acontecer. Aquilo que dizemos tem de ser dito. Aquilo que fazemos tem de ser feito. E, não vale a pena ficarmos submersos nesse mundo de possibilidades que, afinal de contas, não nos levam a lado nenhum. Mas como disse uma vez o outro, é bom sonhar, é bom questionar.. por isso, não o deixem de fazer, porque eu, com certeza, não o vou fazer.

quinta-feira, 24 de março de 2011

Ela ladra, mas não morde!

Feira da ladra,  Esta é sem dúvida uma feira da qual todos ouvimos falar frequentemente. Mas será que quando nos pronunciam tal feira não a julgamos da pior maneira? Isso é o que pretendo descobrir!
A feira localiza-se no Campo de Santa Clara, em Lisboa, e funciona todas as terças-feiras e sábados. Desde manhãzinha até ao final da tarde qualquer um de nós pode deslocar-se até ao local em que a feira se realiza e ser deslumbrado pelos panos que se encontram espalhados pelo chão e pelos objectos de segunda mão. Entre estes objectos podemos encontrar móveis, livros, revistas, roupas, discos de vinil, quadros, etc.
O segredo da ida a esta feira é: não questionar a origem dos objectos. São objectos de valor, de qualidade, com uma beleza inesgotável e extremamente úteis. Por isso mesmo, nesta feira a origem é algo que tanto os compradores como os visitantes devem ignorar, ou pelo menos tentar fazê-lo.
Portanto, se és uma pessoa sem receios e com uma mente aberta do que estás à espera? No próximo sábado, corre até à famosa paragem do eléctrico 28, no Arco de São Vicente. Desde o inicio da rua do Arco até ao mercado vais ser deslumbrado por bancadas com os mais diversos objectos, e quem sabe não sairás de lá com uns brincos retro, um bibelot ou algum objecto extremamente antigo. Não receies mais, a feira, que não morde, espera por ti!

''Pago na mesma moeda''

Sempre ouvi dizer que aquilo que fazemos aos outros volta para nós de igual forma e intensidade. Ainda era pequena e a minha mãe dizia ''N. não faças isso aos teus amigos, olha que depois todo o mal que lhes fizeres volta todo para ti''. Mas, como pequena irrequieta, não ligava. Continuava a fazer as traquinices de uma criança normal. Se o mal ou  partidas parvas que fiz voltaram para trás não me lembro.
Hoje, com 19 anos, acredito cada vez mais no karma. Não tenho receio de afirmar que o mal que fazemos ou que nos fazem sabe qual é ''o caminho exacto para a sua casa''. A reacção à acção tomada pelas pessoas em questão pode não ser conhecida pela sua rapidez, mas, meus amigos, acreditem que é eficaz. Se o vosso amigo se ri porque vocês caíram, não duvidem que, mais cedo ou mais tarde, esse mesmo amigo irá dar uma queda à vossa frente. Ou, não desconfiem de que o ''mal'' que o Sócrates fez ao país irá voltar para o sitio de onde veio. Uma cobra venenosa roubo-vos a ideia para uma reportagem ou de uma ideia criativa para uma campanha publicitária? Não se preocupem, o mal que fazemos aos outros é ''pago na mesma moeda''.
No futuro, não vou mudar esta minha opinião acerca do karma. É impossivel que tudo aquilo que nos fazem, seja mau ou bom, não volte para a sua origem. Quer dizer, é mais fácil acreditar que quem faz coisas boas  é recompensado e que os individuos gananciosos e maldosos recebem em troca todo o mal que fizeram a outrém. Lá está a dita ''fraqueza'' do ser humano.. um ser incapaz de acreditar na injustiça das coisas. Um ser que não tem dúvidas que mais cedo ou mais tarde alguém irá ser louvado ou odiado pelas suas acções. E, no dia de hoje, José Sócrates é um exemplo disso mesmo. Um homem que fez trinta por uma linha e o que lhe aconteceu ontem e continua a acontecer hoje e, com certeza, irá acontecer amanhã? Ontem, hoje e amanhã José Sócrates recebe ''de volta'' todo o mal que fez aos portugueses.
Mas, não quero acabar esta minha linda reflexão a falar deste senhor. Quero sim sublinhar que, ontem, hoje e amanhã tudo o que darei aos outros é o melhor de mim. Por isso mesmo aquilo que vou receber é (supostamente) o melhor dos outros, porque o que dou é pago exactamente na mesma moeda. E isto, meus amigos, é o belo e implacável Karma.

domingo, 20 de março de 2011

Vá, só para terminar bem esta noite de domingo..

Cansada

Hoje estou cansada. Cansada de ouvir falar sobre o PEC e a possivel crise política a que este belo ''documento'' pode levar. Cansada de ouvir falar na central nuclear de Fukushima e nos seus reactores. Cansada da situação na Líbia e do lider Kadafhi que teima em permanecer no poder. E é isto, meus amigos. É domingo à noite e eu estou cansada com tudo aquilo se que passa no meu pobre  país e no mundo. Infelizmente, este não é um dia em que penso positivo. Penso que o meu país não vai sair da cepa torta, que a situação na Líbia ainda vai dar pano para mangas e que o Japão precisa de ter muita coragem e de acreditar que no final vai correr, vai ter de correr, tudo bem. Este é o meu cansaço, um cansaço normalíssimo de domingo à noite, pena é ser meu.

N.Vieira

sexta-feira, 18 de março de 2011

M de morte

Tenho medo da morte. Não penso no verdadeiro sentido desta palavra e, talvez por isso mesmo, nunca tivesse chegado à conclusão de que sim, tenho medo da morte. A ideia do medo do desconhecido é algo que nos transmite uma sensação de terror. A morte é isso mesmo, o desconhecido. Mas, para mim, é um desconhecido demasiado obscuro. O meu medo é maior quando penso em tudo aquilo e todos aqueles que deixamos para trás quando partimos (odeio a palavra partir, é demasiado impessoal, fria). A verdade é que todos os dias falamos de pessoas que morreram ou recebemos a notícia de alguém de quem gostamos muito que morreu. Apesar disso, pelo menos no meu caso, quando oiço este tipo de coisas acho que não penso no real valor desta palavra: Morrer. E se agora o meu pai morresse? E se eu morresse? Como seria para aqueles que cá ficam? O que aconteceria à minha alma (se é que a tenho)? Não passam de perguntas às quais eu não consigo obter uma resposta concreta. E, eu sei que é bastante estúpido ter medo do desconhecido, pois esse desconhecido tanto pode revelar-se algo bom ou mau. Mas, nem por isso deixo de ter medo da morte. Não tenho propriamente medo do acto em sim, mas de tudo e todos aqueles que ele implica. Quando acordo nunca penso que este pode ser o meu, o vosso ou o último dia deles. A verdade é que pode ser. Como ser humano que sou, escolho sempre o caminho mais fácil, o caminho de acordar todas as manhãs e fugir a sete pés da frase ''este pode ser o meu último dia''. Pensar na morte não é, nunca é o caminho mais fácil. Por isso mesmo eu, e talvez muitas outras pessoas, evito pensar na morte. Não porque ela implica uma data de coisas, mas sim porque tenho medo, tenho medo dela.

N.Vieira

(Nota: Eu li as Intermitências da Morte de José Saramago. Amei o livro e  vi um outro lado da morte, mas mesmo assim não deixei de ter medo dela)

quinta-feira, 17 de março de 2011

Foi por isto que EU fui para jornalismo

Segundo uma notícia publicada no Público online, ''ter um mau emprego pode deprimir tanto como estar desempregado''. Eis aqui a resposta a todos os meus problemas. Quando dizia às pessoas que queria seguir jornalismo deparava-me, na maior parte das vezes, com a seguinte expressão: ''Oh minha querida, com tanto desemprego por aí ainda vais tirar um curso desses?!''. E sim, fui tirar um cursos DESSES. Sabem porquê? Porque era exactamente aquilo que eu queria fazer. É uma profissão que tem tudo a ver comigo, que me compreende, me possibilita um milhão de coisas fascinantes e que me ajuda a crescer todos os dias. Portanto, eis o meu espanto/contentamento quando ''dei de caras'' com uma notícia do Público, baseada num estudo publicado pela revista ''Occupational and Environmental Medicine'', que referia o facto de um emprego mal pago, insatisfatório, demasiado exigente e mau ''em termos psicossocias'' ter efeitos depressivos mais agravados do que o desemprego. Por isso mesmo posso dizer que, preferi ir para jornalismo porque é um curso de que eu gosto. Eu, mais que todas essas pessoas que proferiam tais comentários, sei que encontrar trabalho não vai ser fácil mas a verdade é que quando fazemos uma coisa da qual gostamos a motivação é uma constante. E, se algum dia me virem deprimida, com certeza, não vai ser porque estou desempregada.. mas sim porque tenho um trabalho do qual não gosto.

N.Vieira
Fonte: http://www.publico.pt


O jornalismo na vida de uma bailarina

Aos dez anos, Ana Robalo sonhava com o mundo competitivo do ballet e com a oportunidade de ser contratada por uma das melhores companhias de bailado do mundo. Hoje, aos 19 anos, o sonho é outro: ingressar no mundo competitivo e fascinante do jornalismo.
Os olhos castanhos desta estudante de jornalismo brilham quando fala de ballet e quando relembra os muitos anos que dedicou a esta arte. Apesar disso afirma ‘’Agora, o jornalismo é a minha aposta a dança passou para segundo plano’’. A residente de Oeiras não hesita um segundo em dizer ‘’Vejo mais hipóteses de vingar no mundo do jornalismo do que no do ballet’’.
A escolha do curso não foi difícil pois afirma ser uma pessoa fascinada pelo mundo da televisão e das letras. O jornalismo foi, segundo Ana, ‘’a profissão que englobava as duas coisas e daí ter parecido a opção mais acertada’’. A jovem, que sonha em poder trabalhar no mundo da televisão ou das revistas de moda e cultura, não teme em afirmar que à medida que o curso tem avançado os obstáculos têm sido mais e maiores. No entanto, o desafio e deslumbramento constante não a deixam desistir e todos os dias lhe dão a força de vontade de singrar neste ramo.
‘’Acho que sou uma pessoa muito justa porque consigo ver sempre os dois lados das situações’’, conta. Ana considera esta a profissão ideal para si por ser uma pessoa que consegue, tal como em todas as outras situações, encontrar no jornalismo o seu lado bom e mau. A realidade é que esta aluna de jornalismo sempre lidou com o mundo competitivo do ballet mas nem por isso desistiu do seu sonho. O mesmo se aplica ao jornalismo, pois Ana sabe que a competitividade vai ser uma constante na sua vida mas afirma que ‘’sempre aparecerão coisas boas que me vão prender a esta profissão’’.
A irmã mais velha de três irmãos revela ainda não ter notado muitas diferenças na sua relação com os outros mas espera que o jornalismo a ajude a tornar-se numa pessoa mais objectiva relativamente àquilo que quer. Agora, esta apaixonada por ballet, afirma estar mais atenta a tudo o que a rodeia e a sua preocupação com os problemas mundiais é frequente.
Todos os dias, Ana vai para a faculdade e revela ser invadida pelo mesmo pensamento ‘’o conjunto de esforço e fascínio é o segredo para singrar no mundo do ballet e jornalismo’’. Para Ana, o mundo da dança ficou para segundo plano, dando, assim, a oportunidade ao mundo do jornalismo.

N. Vieira
(Perfil elaborado na disciplina de Laboratório de Génereos Jornalísticos)

segunda-feira, 14 de março de 2011

zapping

Uma noite de domingo normal. Acabada de chegar da terrinha e sem paciência para falar sobre todos os males que têm vindo a afectar o Japão, a manif de ontem, o movimento que surgiu no facebook que visa obter um milhão de apoiantes para a demissão do Governo e a paralisação de camionistas que provavelmente irá afectar todo o país. Visto isto, ligo a televisão. A RTP1 é sempre o primeiro canal. Deparo-me com um daqueles filmes de bolinha vermelha. Imediatamente penso que a minha noite não vai melhorar, antes pelo contrário, se o continuar a ver. Segue-se a RTP2 e a Câmara Clara. Hoje não estou muito virada para uma noite de cultura e bom senso por isso opto por, mais uma vez, mudar de canal. Eis que chego à SIC e a conclusão de que Portugal possui mesmo muito pouco talento é inevitável. Infelizmente, tive a triste ideia de ver o que se andava a passar na TVI. Agora é que fiquei mesmo arrependida. Um programa que ''se aproveita'' do sonhos de umas pobres criancinhas que só querem cantar?! O zapping chega ao fim. Com ele vai a minha confortável noite de domingo. Só ficou mesmo a vontade de dormir, dormir na esperança de amanhã as coisas correm melhor na plataforma televisiva. Esperemos que um dia eu e todos os meus colegas tenhamos a possibilidade de fazer algo de diferente e com qualidade por estas nossas noites de televisão portuguesas. Um dia será a  noite, eu sei.

N.Vieira

sábado, 12 de março de 2011

Verdade nua e crua

''Somos feitos de carne mas temos de viver como se fossemos feitos de ferro" Sigmund Freud

acordar, viver, adormecer

Um dia acordei. Acordei e percebi o quanto me fazias falta, o quanto eu gostava de ti, o quanto queria ter um futuro contigo, o quanto eras importante para mim, o quanto pensava num nós. E depois? Tinha medo. Tinha medo de uma relação,  medo de não dar certo,  medo de arriscar,  medo de mim, medo do sentimento, medo de me magoar e de te magoar, medo do medo. Arriscar? Por vezes trata-se de arriscar, para sentir, para gostar, para ser feliz, para fazer feliz, para sentir-me em ti, para te sentires em mim, para tudo. Custa? Custa muito, luta-se muito, tenta-se muito, sofre-se muito, procura-se muito, ri-se muito, perdoa-se muito, gosta-se muito. Vale a pena? Vale sempre a pena, porque é bom, é maravilhoso, é mau, é doloroso, é questionável, é duvidoso, é chato, é cansativo, é amor, é vida! E no fim? No fim não se sabe, não se tem a certeza, não se tem dúvidas, não se magoa, não se separa, não se chora. Voltei a adormecer. Voltei a sonhar contigo, connosco, com o essencial, com o abraço, com o beijo. Enfim, percebi que não há fim, todos os dias há um começo.

N.Vieira

Não sei o que é o amor

Amor? O que é isso na realidade? Um dia acordo e acho que amor é aquilo que sinto pelos meus pais, aquele sentimento demasiado forte impossivel de explicar. Outro dia acordo e acho que amor é aquele bichinho carpinteiro no meu estômago que me invade cada vez que tu  passas. Um novo dia vem e o amor passa a ser a vontade de esmurrar o meu irmão porque deixou, mais uma vez, a tampa da sanita para cima ou aquele cafezinho rápido, mas nem por isso menos bom, com a irmã mais velha. Mais um dia passa e o amor  parece ser aquele aconchego no coração cada vez que os amigos me demonstram que afinal a verdadeira amizade ainda existe. Um dia vou no metro e afinal percebo que o amor é aquele casalinho de surdos-mudos que falam como se não houvesse amanhã. O dia é ainda uma novidade e o amor passa a ser os dois gatos do meu quintal que se lavam um ao outro num acto de extrema paixão. Ainda é de dia e volto a mudar de opinião sobre o amor, agora é um abraço entre a avó e a neta que passeiam no jardim. O dia está mesmo a terminar e volto a compreender que o conceito de amor mudou, ele agora representa o sorriso constrangedor e proibido do João para o Pedro. Mas.. será que o amor é composto por uma pluralidade de definições que no final de contas não significam absolutamente nada? Talvez. A verdade é que o amor talvez represente isto tudo mas continuo a não saber o que é o amor, porque para mim ele pode ser tudo mas também pode ser nada. Lá está, não sei o que é o amor mas nem por isso o deixo de sentir.

N.Vieira

sexta-feira, 11 de março de 2011

À minha volta

Todos os dias acordo e o primeiro pensamento que me ocorre é: ''Este dia vai ser melhor''. Infelizmente, não posso dizer que todos os dias são melhores. Ou descubro que alguém de quem gosto mais do que tudo tem cancro. Ou me deparo com a notícia matinal de um sismo, seguido de um tsunami num dos países mais populosos do mundo. Ou começo a perceber que afinal as pessoas não são como parecem. Ou não compreendo como vivo num país que está em plena crise económica e que não é capaz de proporcionar as oportunidades que os mais jovens merecem. Ou chego à conclusão de que a vida consegue ser mesmo injusta. Mas será que nestas contradições de ou e mais ou algum dia vou conseguir perceber aquilo que se passa à minha volta, aquilo que se passa dentro do meu eu? Não sei.. por mais frustrante que seja não sei mesmo. Começo a acreditar que o mundo em que vivo consegue ser traiçoeiro, ameaçador, destruidor e cruel de um modo extremo. E o que ganho eu com esta ''brilhante'' conclusão? Pois é, podem dizer sem medo nem meio medo, não ganho absolutamente nada. Tal como Pessoa, sou dona de uma lucidez que me corroí, destroí e que nem por isso me faz feliz. Será que ao sermos plenamente conscientes daquilo que nos rodeia adianta de alguma coisa? Acho que, mais uma vez como Pessoa, nunca vou conseguir obter uma resposta definitiva a isso. Mesmo assim, todos os dias acordo com o mesmo pensamento porque deixar de acreditar é deixar de viver.

N.Vieira

quinta-feira, 3 de março de 2011

Cegueira

"Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara.’’
José Saramago, Apresentação pública do livro Ensaio sobre a Cegueira


Nunca tinha pensado no verdadeiro sentido da palavra cegueira até ao dia em que esta forçosamente se impôs na minha rotina. Acordo, com a ajuda da minha mão pego na bengala e dirijo-me por instinto à casa de banho. Agora já consigo tratar da minha higiene sozinha. Decorei qual é o lugar permanente dos champôs, da minha escova de dentes, do chuveiro e até do armário onde estão guardadas as tolhas de banho. Depois de superar um dos muitos obstáculos que enfrento todos os dias chego sempre à conclusão de que tenho fome. A cozinha fica mesmo ao lado do meu quarto e por isso a tarefa de chegar até lá é bem fácil. E vestir? Nem me digam nada… Sempre fui uma mulher vaidosa que planeava detalhadamente o que usar e como conjugar todas as peças de roupa. O meu mais precioso amigo, o tacto, adquire aqui um papel crucial pois é ele que, juntamente com as etiquetas em Braille que imperam no meu armário, todos os dias me ajuda a perceber se determinada peça de roupa fica bem com outra. Apesar disto ainda sinto a falta do pensamento que diariamente me ocorria quando me via ao espelho: ‘’Até estou bonita’’.Saio de casa. A bengala, aquele pau de ferro que costumam tratar como um objecto inútil, tornou-se uma das minhas melhores amigas e é com ela que me oriento até à escola de Braille. Adorava dizer que a escola é verde, espaçosa, cheia de quadros, que tem um jardim magnífico e que o porteiro Pedro é lindo de morrer. Não posso fazê-lo. Posso sim dizer que as paredes são frescas, talvez feitas de gesso. O chão é frio, algo que senti no dia em que decidi ir descalça depois de três longas horas à procura de qualquer tipo de calçado, e, com o ligeiro pó que se entranhou nas minhas unhas, talvez um pouco sujo. Não sei se a minha sala de aula é grande mas tenho a certeza de que o chão é alcatifado pois a sensação de algo brando debaixo dos meus pés não passa em vão. A professora Regina cheira a maçã verde, talvez utilize aquele perfume da DKNY característico pelo seu cheiro a maçã.Nunca fui de fazer amizades facilmente. Isso mudou. Fui para um local repleto de pessoas que passam as mesmas dificuldades que eu. Todos os dias nos rimos com os episódios insólitos de ou quase sermos atropelados pelo autocarro ou em vez do 714 apanharmos 750 e irmos parar a Algés. A indignação de cair numa poça de lama que ‘’se atravessou’’ no nosso caminho é algo que nos persegue mas nem por isso nos aguilhoa. Acho que me tornei numa pessoa mais sociável e em vez de escolher os meus amigos pela sua cor ou aparência comecei a fazê-lo pelo seu óptimo perfume ou pela sua voz suave que me acalma.Até aqui tenho dito somente coisas positivas acerca da minha cegueira, não é? Infelizmente, não posso dizer que tudo é um mar de rosas porque não é. Todos os dias levo encontrões, oiço comentários do género ‘‘Saí daí estúpida, olha que o carro te passa por cima’’ ou ‘’És cega ou quê?’’, mas nem por isso abdico da minha liberdade e continuo a andar sozinha na rua. Aliás, às vezes até reforço a ideia de que os verdadeiros cegos aqui são muitas dessas pessoas que me insultam pois ou não vêem ou teimam em ignorar as injustiças que vigoram na nossa sociedade. Voltando à minha cegueira, uma das coisas que me custa é não poder ver o azul do céu ou ver o meu namorado, nunca o vi. Tenho saudades de ver a minha mãe, o meu pai e os meus irmãos. Apesar disso quando toco na textura das suas peles e os distingo pelas suas diferentes tonalidades de voz é como se por momentos os estivesse a ver claramente. E coisas simples como ir ao cinema ou a uma exposição de pintura? Não é possível imaginar a falta que tudo isto me faz. Mas retornando àquilo que preenche os meus dias e como a minha mãe sempre disse que ter um hobby é bom para me distrair optei por experimentar a olaria. Descobri que não há nada melhor como sentir o fresco do barro a desfazer-se nas minhas mãos. A olaria foi uma prova de que ainda sou capaz de moldar coisas bonitas apesar de não as poder contemplar.Regresso a casa. Lá está o Miguel, o meu namorado, pronto para mais uma aula de culinária. Não deixei de cozinhar e agora até saboreio as coisas mais intensamente. Hoje em dia, reconheço os alimentos pelo seu cheiro e forma. Conhecem aquele mito que defende a ideia de que os cegos quando nascem ou perdem a visão ganham um super poder e puff os restante sentidos estão aprimorados? É mentira. Como tudo na vida implica esforço e dedicação. Por isso mesmo, afirmo que o meu olfacto e paladar estão bastante mais apurados devido ao treino constante e não a qualquer super poder que adquiri. É, então, o olfacto que me permite distinguir o açafrão, com um cheiro mais salgado, da canela que tem como característica o seu cheiro doce que se assemelha ao açúcar. Aprendi a ver os alimentos com as mãos e com isso a repugnância de tocar em peixe cru ou nas moelas da galinha desapareceu, restando somente a vontade de comer.Depois de o serão a ouvir música ou a ler, dou um beijo ao Miguel e espero-o na cama. Antes de adormecer todos os dias sou invadida pelo mesmo pensamento: ‘’Como a minha vida mudou’’. Acho que todos aqueles que me rodeiam ou que se cruzam comigo na rua têm pena de mim e pensam que sou a coitadinha que não vê. Esses que o fazem julgam-me mal. Sou muito feliz. Aliás, posso dizer que quem tem pena deles por vezes sou eu pois infelizmente vivo num mundo onde a cegueira social é bem mais grave do que a minha pobre cegueira. Problemas sociais, como o desemprego, a prostituição, os roubos e a discriminação são ignorados, propositadamente ou não, pela maioria das pessoas. A maior dificuldade que alguma vez alguém poderá enfrentar não é não poder ver onde deixou os óculos ou onde é a cozinha mas sim não conseguir enxergar as injustiças e a precariedade que caracterizam o nosso país. O acidente que me causou a cegueira não me destruiu, ele só me tornou mais forte e me deu razões para agarrar a oportunidade de ‘’ver’’ a vida de outra forma. Esta cegueira pode ser um problema ou um azar mas é minha e quem se tem de importar com ela sou eu. Bem pior talvez seja a cegueira que abrange grande parte da sociedade e nem com essa alguém se parece preocupar. 

N.Vieira