terça-feira, 24 de abril de 2012

timming

Começa, naturalmente. Como de outra forma qualquer as coisas desenrolam-se. E, como de outra forma qualquer, corre tudo bem, é tudo perfeito. Mas nem tudo é assim tão fácil. Quando as coisas parecem bem, não o estão. É assim nos filmes, nos livros, na vida. Baseia-se nos desencontros, na vivência diferente das coisas. Acho que é o chamado timming. Às vezes quando mais se quer algo, menos se pode ter. Depois, quando menos se está à espera, tudo se torna possível. Mas, será que quando a possibilidade aparece as coisas são iguais ao que eram? Muito se passou, muito se viveu, muito se cresceu, muito se mudou. Não se diz respeito à sinceridade ou à validade do sentimento. Diz respeito ao timming. Foi ele. Veio no tempo errado. Não acertou. Mas veio e isso sim é o imporante. Agora só se trata de saber lidar com ele. Eles souberam, pelo menos foi o que filme me disse.

N.Vieira

quinta-feira, 19 de abril de 2012

o grito

Gritou. Este não era um grito de alivio. Este não era um grito de desespero. Era um grito verdadeiro. Um grito de frustração. O acto de gritar não lhe era comum. Mas, naquela hora, tinha de o fazer. O acto de gritar libertava aquilo que o corpo escondia. A liberdade era finalmente sentida, vivida. O corpo continha aquilo há demasiados meses, semanas, dias, horas, minutos, segundos. O grito não vinha por desespero, sublinho. O grito vinha porque assim tinha de ser. E não se pode ignorar um grito. Venha ele de onde vier. 

N.Vieira

quarta-feira, 18 de abril de 2012

à sua normalidade

Chovia. Não tinha parado de chover. Já eram dois dias inteiros disto. As ruas eram lavadas. As estradas eram lavadas. Mas, mais importante, as almas eram lavadas. Cada gota que chegava trazia algo. Cada gota que caía fazia algo. As pessoas pensavam mais, questionavam-se mais. Talvez sentissem falta do sol. A verdade é que a chuva transformava o humor de qualquer ser humano. A chuva afastava a comédia e apelava mais ao drama. Mais uma vez, talvez fosse a saudade do sol. Até que parou de chover. As ruas voltaram ao estado normal. As estradas voltaram à sua realidade. E as almas voltaram àquilo que eram. Até que se percebeu: é e sempre será assim, no fim volta tudo à sua normalidade.

N.Vieira

sábado, 14 de abril de 2012

no seu mar

Estalou os dedos. Quando abriu os olhos estava coberta de mar. Deixou-se ficar. As ondas vinham e iam. Traziam areia e outros sedimentos. Não se importava. Cada onda que vinha trazia algo de novo. Refrescava. Desvendava. Descobria. Gostava. Quatro verbos aplicados à sua realidade, pelo menos à realidade daquele momento. Ficou ali. 1 hora. 2 horas. 3 horas. O tempo passou, mas não por si. Quando decidiu estalar os dedos não conseguia. Estava presa àquela realidade. Por breves momentos entrou em pânico. Mas, rapidamente, o pânico passou. Veio sim a surpresa. A surpresa de ter tido sorte, de estar no seu mar.

N.Vieira

segunda-feira, 9 de abril de 2012

três toques

Triiiiim. Triiiim. Triiiim. À terceira foi de vez. Decidiu atender. "Sim, como estás?". Uma resposta demorada, receosa foi dada por fim. "Podia estar melhor". Não valia a pena estar ali com rodeios. Já tinha sido, já tinha acontecido. Nada podia ser feito. O voto de confiança já tinha sido dado. E, por agora, mantinha-se. Mas, desta vez estava mais forte. Tinha crescido, enfrentado coisas piores. Desligou. Deitou-se por breves dez minutos. Levantou-se. Jantou. Conviveu. Voltou à normalidade. Diziam que estava diferente. Agora viu-se. Por fim, cresceu. 

N.Vieira

quinta-feira, 5 de abril de 2012

o seu silêncio

Shiuu. Dizia para si mesmo. Queria ouvir o nada, sentir o silêncio. Desde que tinha saído do seu casulo gostava de contemplar o silêncio, principalmente aquele. Tinha posto de lado o barulho ensurdecedor que o impedia de agir. Ficava ali sentado, parado. Só depois agia, mas agora sem medos, sem inseguranças. A atmosfera da casa tinha-se tornado mais acolhedora, mais sua. Precisava daqueles seus momentos. Quando se levantava tudo lhe parecia mais simples, menos confuso. A questão era essa: tinha aprendido a conviver consigo e com o seu silêncio. A surdez tinha tornado real um mundo que antes achava ser só possível nos sonhos. Agora era ele e o seu silêncio. Agora era mais feliz. Quem diria, certo?

N.Vieira

quarta-feira, 4 de abril de 2012

a cor

Normalmente, gostava de se encher de cor. Achava que a cor apagava o que era mau, incolor. Não deixava de acreditar que era a cor que a ajudava todos os dias. Enchia o seu dia de cor. Dava cor às pessoas, à música, ao mundo.  Fazia da cor uma constante na sua vida. Mas preocupava-se com o seu excesso. Quando algo existia em demasia podia ser negativo. A cor não podia existir em demasia. Todos os dias a media, pesava e quantificava. No fim de cada dia fazia o balanço final. A cor que tinha sido usada era a ideal. Nem um grão a menos, nem um grão a mais. Tinha a sua cor, não precisava de mais nada. Pelo menos até àquele momento. 

N.Vieira