sexta-feira, 29 de abril de 2011

Quando apago a luz

Apaguei a luz. Estavas ali, bem junto a mim. As tuas mãos eram as mesmas, fortes e grandes. Os teus dedos continuavam compridos mas suaves. A tua respiração estava, como sempre, ofegante. A tua boca colada ao meu pescoço, sabendo perfeitamente que estava a criar o arrepio habitual. O teu coração, sem excepção, batia a mil à hora. A tua barriga pregada à minha mão. As tuas pernas entrelaçadas. Os teus pés enrolavam-se nos meus, procurando esquecer o frio que os envolvia. Os teus dedos dos pés enroscados uns nos outros, tentando apagar a solidão que os perseguia. Os teus pensamentos envolviam o escuro, não deixavam o sono aparecer, eram como uma prisão. E eu? Eu deixava-me levar pelo escuro, pelas mãos, pelos dedos, pela respiração, pela boca, pela barriga, pelas pernas, pelos pés, pelos dedos dos pés e ainda pelos pensamentos. Não resistia, não lutava, deixava-me ir… Até ao ponto em que acendi a luz e tu já não estavas lá. Tinhas sido vencido pela prisão de pensamentos que te obrigava a ir, que não te permitia ficar. Agora? Agora, quando apago a luz, já nem no escuro apareces.

N.Vieira

sexta-feira, 22 de abril de 2011

lá fora

Como se lá fora o mundo estivesse parado. Como se não se ouvisse o som de um único pássaro. Como se não se visse nenhum carro a passar. Como se tivesse parado de chover. Como se o vento não soprasse mais. Como se uma nuvem de magia se apoderasse do resto do dia. Como se não se visse absolutamente ninguém na rua. Como se todas as lojas estivessem fechadas. Como se as janelas estivessem seladas. Como se todas as portas estivessem trancadas. Como se cada pessoa se escondesse do mundo. Como se cada um de nós  se guardasse na sua casa. Como se cada individuo se amasse no seu interior. Como se a partilha não saísse de quatro simples paredes. Como se o sentimento exterior fosse veneno. Como se o ar faltasse. Como se as mãos ficassem geladas. Como se os dedos perdessem a mobilidade. Como se o cérebro deixasse de raciocinar. Como se os olhos se fechassem lentamente. Como se o coração deixasse de bater. Como se o meu eu  nunca deixasse de existir. Como se o teu  eu permanecesse inteiro. Como se o nosso nós  fosse eterno. Como se o que se passa lá fora e o que se passa cá dentro nunca mudasse. 

N.Vieira

Surpreende-te

O destino surpreende-me. A vida surpreende-me. Eles surpreendem-me. Vocês surpreendem-me. Tu  surpreendes-me. O que sinto? Na verdade, sinto um turbilhão de coisas. Mil e um sentimentos que me invadem a todo o instante, mas que nem por isso são maus. Por isso chego à conclusao de que é bom acordar e ser surpreendida, é bom adormecer e ser surpreendida, é bom sonhar e ser surpreendida, é bom viver e ser surpreendida. Porquê? Porque aquilo que nos surpreende tem mais impacto, mais magia, mais interesse, mais realidade, mais irrealidade, mais verdade. Como? Com um pensamento surpreendente, com uma fala surpreendente, com um sorriso surpreendente, com umas mãos surpreendentes, com uma boca surpreedente, com um ser surpreendente. E agora? Agora sou surpreendida a todo o instante. Agora procuro o surpeendente, Agora não tenho medo do surpreendente. Agora vou encontrar o surpreendente. Agora vou ser o surpreendente.

N.Vieira

terça-feira, 19 de abril de 2011

não gosto

Não gosto de muita coisa. Não gosto de tabaco, de ginja, de figos e de coelho. Mas a comida é só uma pequena parte das coisas de que não gosto. Não gosto de dormir com os pés destapados, se o fizer parece que me falta o "chão". Não gosto de sair de casa de cabelo molhado, as pingas que escorrem constantemente pelo meu cabelo molham tudo à minha volta. Não gosto de ver filmes de terror, quando o faço penso sempre: "Muito bem N, lá foste tu, mais uma vez, armar-te em forte". Não gosto de que me elogiem demasiado, acho que os elogios quando são feitos a toda a hora perdem o seu verdadeiro valor. Não gosto de ver filmes com intervalo, acho que a sequência do filme é quebrada. Não gosto de telemóveis touchscreen, fico tempo a mais a escrever o que quer que seja. Não gosto do vento, leva tudo o que nos rodeia e, a maior parte das vezes, não traz nada de volta. Não gosto de ver reality shows, exploram em demasia a vida das pessoas. Não gosto de hospitais, trazem más recordações. Não gosto de perder amigos, fazem sempre falta. Não gosto de dizer as coisas da boca para fora, é uma acção que consegue trazer consequências desagradáveis. Podia ficar aqui mais tempo a pensar em coisas das quais não gosto mas é sempre melhor ocupar o meu tempo a pensar nas coisas de que gosto e a vida é uma delas.

N.Vieira

domingo, 17 de abril de 2011

pensar

Ás vezes penso na vida. Penso em tudo aquilo que ela nos oferece. Penso em tudo aquilo que ela nos tira. Penso nas coisas boas que nos podem acontecer. Penso nas coisas más que, por vezes, tendem a aparecer. Penso no porquê de certas coisas serem tão complicadas. Penso que tudo poderia ser mais simples. Penso em como gostava de poder fazer algo. Penso que queria esforçar-me mais. Penso que queria ser mais forte. Penso que queria preocupar-me menos. Penso em pensar menos. Penso em deixar-me levar. Penso na forma como faço as coisas. Penso nas pessoas. Penso na pessoa. Penso na forma como vocês  fazem as coisas. Penso em como aquilo que vocês  fazem me afecta. Penso em ti. Penso em como ás vezes seria mais fácil não pensar em ti. Penso em mim. Penso em como seria mais fácil não pensar em mim. Penso nas voltas que a vida dá. Penso nas voltas que a vida não dá. Penso no tempo. Penso no tempo que perco a pensar, e por isso páro. Por vezes, parar de pensar é mesmo o melhor. Acho que é isso que vou fazer agora: parar de pensar.

N.Vieira

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Acaso

O acaso que me surpreende. O acaso que me deixa feliz. O acaso que todos os dias me preenche. O acaso que, muitas vezes, não me deixa ser quem sou. O acaso que me consegue pôr em baixo. O acaso que nunca me desiludiu. O acaso que sempre esteve presente nos momentos mais importantes. O acaso que me desperta para algo novo. O acaso que me consegue levar a pensar diferente. O acaso que tem a capacidade de me influenciar. O acaso que é bom. O acaso que pode ser mau. O acaso que não é doloroso. O acaso que é cruel. O acaso que me faz tão bem. O acaso que está sempre aqui. O acaso que tu  foste. O acaso que eu  fui. O acaso que nós  fomos. O acaso que toda a minha vida é.

N.Vieira

quinta-feira, 14 de abril de 2011

vamos errar

Errar? Sempre ouvi dizer que errar é humano. Não ponho, nem nunca pûs, esta questão em causa. Todos somos seres humanos e, como tal, podemos errar. Ás vezes é mesmo preciso fazê-lo. Porquê? Porque não somos perfeitos, porque temos a necessidade de aprender com os nossos erros, porque um erro pode dizer muito sobre nós e porque um erro não faz de nós más pessoas.Se gosto de errar? Quem gosta? Ninguém. O erro é algo que nos custa, que à primeira vista não nos leva a conclusão alguma, que no geral não é bem aceite. Mas, nem por isso é algo mau. Precisamos de errar. E, por vezes, sabe tão bem errar, sabe tão bem fugir à monotonia da nossa vida e, pelo menos uma vez nada vida, arriscar. Já que somos seres imperfeitos, que não conseguem escapar da inevitabilidade do erro, vamos tirar dele o melhor possivel. Sim sim, aprender com ele e tal, essas tretas  muito bonitas que toda a gente sabe. Mas, vamos tirar dele a experiência, o desejo do proibido, a magia de algo novo. Por isso, que tal um pequeno  erro agora?

N.Vieira

terça-feira, 12 de abril de 2011

um dos melhores

Quando me pedem para falar deste filme nunca consigo transmitir aquilo que realmente senti. Surpresa? Suspense? Simpatia? Medo? Dúvida? Amor? Fantasia? Sim, senti isto tudo. Podia ficar aqui um dia inteiro a descrever tudo o que senti, a enumerar as partes que mais gostei, a revelar o segredo do filme, a destacar personagens que me preencheram. Não o vou fazer. Acho que a mensagem do filme deve ser compreendida pela própria pessoa. Porquê? Porque todos nós vivemos, em algum momento da nossa vida, histórias fantasiadas, incertezas estúpidas, repugnância de alguém que mal não nos quer, ou medo de descobrir algo que não queriamos. Mas, sou suspeita. Gosto de todos os filmes do Tim Burton. Sou contagiada pelo irreal dos seus filmes, mas um irreal que se quer viver, custe o que custar. Big Fish, é sem dúvida uma das melhores coisas que já vi.

N.Vieira

teoricamente falando

Não me canso de falar. É a mais pura das verdades. Sou uma amante da fala, do som, do sentido, da cor, da magia das palavras. Não há nenhum dia em que não acorde e não pronuncie uma única palavra, mesmo que essa palavra seja para resmungar ou responder mal. Acho que nasci a falar, só pode. Mas, falando de coisas sérias, acho mesmo que a fala é sem dúvida uma das mil maravilhas do mundo. Já viram como ao falar podemos fazer tanta gente feliz ou infeliz? Como uma simples palavra pode mudar o mundo? Ou como o som que saí da nossa boquinha é capaz de fazer alguém rir? E como a pronunciação de uma palavra pode dizer tanto sobre nós? Às vezes nem é preciso que o nosso discurso seja muito longo, porque na realidade conseguimos dizer muitas coisas em poucas palavras, às vezes até só numa única palavra. Por isso mesmo, acho que vivo no mundo das palavras. Sou daquelas pessoas que têm de falar, que não consegue estar calada, que sente a necessidade constante de dizer algo. E pior, quando estou nervosa falo a dobrar. Eu sei que muitas vezes nem é preciso dizer nada, existem actos que valem por si só. Mas, é tão bom escutar alguém a dizer ''gosto de ti'', ou alguém a fazer-nos ver as coisas com estas quatro simples palavras ''acorda para a vida'', ou  um mero ''obrigado'' que pode significar tanto. E mais? Por agora acho que é tudo portanto o melhor é mesmo calar-me, shiu!

N.Vieira

segunda-feira, 4 de abril de 2011

lucidez

Sou invadida por um turbilhão de sentimentos e pensamentos. A dor de pensar a verdade custa. A dor de enfrentar a mentira não é fácil. A dor de lembranças perdidas no tempo é deprimente. A dor de gostar de alguém corroi. A dor de perder alguém é veneno. A dor de ser quem sou pode ser destruidora. Mas.. a recompensa é bem recebida. Uma palavra com sentimento vale pelo mundo. O gosto pela vida é reconfortante. A forma como nos olham pode ser mágica. A maneira como nos falam é sempre, ou quase sempre, verdadeira. O meu eu é exactamente aquilo que sou. A minha lucidez custa, mas faz-me ver as coisas tal como elas são. Esses pensamentos e sentimentos que me invadem a todo o instante fazem parte de um alguém que quer e não tem medo de ser lúcido. Porque a lucidez pode ser crua e fria mas é real e isso é o mais importante.

N.Vieira